sábado, 9 de maio de 2009

A índia que virou universitária - Terra Sem Males


Leonarda realizou o sonho de entrar numa universidade através de um programa para estudantes indígenas

Entrar na faculdade muda a vida de qualquer menina. Afinal, é quando se começa a estudar para ter uma profissão e se conhece um monte de gente. Mas para Leonarda Costa, 22 anos, a mudança foi ainda maior! Diferentemente de suas colegas de classe, que vêem de cursinhos pré-vestibulares e do 3° ano do ensino médio, a garota veio de uma tribo indígena!

Leo atualmente mora em Brasília, mas nasceu em uma aldeia pataxó que fica na região sul da Bahia. Ela viveu lá até ir para a universidade. Na tribo da garota, moram aproximadamente dez famílias. As casas são de barro e não existe luz elétrica nem hospital. Agora a indígena estuda em uma das maiores universidades do país, mora em uma cidade com mais de 2 milhões de pessoas e tem acesso fácil não só à eletricidade, mas também a internet, shoppings e cinemas. De quebra, virou dona de casa. Antes, ela morava em uma casa de cinco cômodos com os pais e os dois irmãos. Agora, mora sozinha e tem que se sustentar: paga aluguel, comida, luz, água...

Leonarda está cursando o quarto ano de nutrição na Universidade de Brasília (UnB) e conseguiu a vaga através de um programa para estudantes indígenas - uma parceria entre a Funai (Fundação Nacional do Índio) e a instituição. Ela recebe uma bolsa de R$ 900 por mês e uma passagem por ano para visitar os pais. Como qualquer garota, Leonarda teve dúvidas na época de escolher que curso prestar no vestibular e levou bomba. "Sempre foi um sonho ter uma formação acadêmica. Fiz dois vestibulares para universidades da minha região, mas não fui aprovada. Minha vida virou uma tristeza", desabafa. A virada dessa história veio com a parceria. Na UnB, há vagas reservadas para indígenas. O vestibular para eles é diferente: só tem questões de português, matemática, literatura e redação. Os cursos ofertados também são limitados. Os indígenas só podem fazer agronomia, enfermagem e obstetrícia, engenharia florestal e medicina.

Quando morava com os pais, a garota acordava cedo para estudar na escola de Cumuruxatiba, cidade onde fica sua aldeia. Lá ela estudou da 1a série ao 3o ano do ensino médio. Depois de ir à aula, a garota ajudava em uma pequena loja de alimentos que a família tinha ou ia à praia com as amigas. No lugar onde Leo nasceu, a alimentação é baseada na pesca e em raízes, como a mandioca. A maior parte da população da aldeia vive da venda de artesanato e mantém costumes, como danças típicas e pintura corporal.

Mas engana-se quem pensa que na aldeia da Leo os índios vivem nus ou dormem em ocas. A aldeia é bem simples e pequena, mas a proximidade com a cidade diminui o choque cultural. "Eu tinha acesso à internet quando ia para a cidade. Eu também me informava por jornais, revistas e livros. Não é como as pessoas pensam", diz. Mesmo assim, a menina se espantou quando chegou a Brasília: nunca tinha visto tanta diferença social. "Aqui todo mundo tem carro, vai a lugares caros!", diz. Na tribo dela, há um cacique, que é quem toma as decisões, mas as diferenças hierárquicas acabam nisso.

O bacana do convênio da UnB com a Funai é que o indígena aprende uma profissão e volta para aplicá-la em sua comunidade. "Os índios, como todos os outros, têm que ter a chance de estudar, pois assim podemos contribuir para nossa comunidade", filosofa. A instituição é responsável por esse retorno e paga os salários dos profissionais. No caso da Leo, a escolha da profissão foi baseada justamente na volta à sua aldeia. "Além de eu me identificar com o curso, vi uma oportunidade de trabalhar para ajudar as pessoas da minha aldeia a comer melhor", conta.

Hoje, Leonarda praticamente vive na universidade. A garota prefere andar com outros indígenas porque, entre eles, rolam menos diferenças. Mas, quando os colegas sabem de onde ela é, sempre querem saber como era a vida da Leo na aldeia. Ela responde às perguntas sem problemas. Preconceito? Por mais estranho que pareça, ele parte de alguns professores. "Eles insinuam que acham errado alguns alunos terem entrado por outros vestibulares", explica. A garota sente muita dificuldade em algumas matérias, como química, mas compensa a dificuldade estudando muito. "Estudo nos intervalos e à noite."

Leonarda é a primeira representante da sua aldeia a se formar em um curso universitário. A menina lida bem com essa grande responsabilidade, mas ainda sofre por algumas coisas. "Sinto falta da comida da minha mãe, de ter meus pais sempre por perto." Sorte que essa sensação logo passa quando ela lembra que logo poderá ajudar a sua família.


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