Fernando Soares Campos
Quando eu era criança, costumava acompanhar, atento, as prosas de meu pai com nossos parentes ou amigos. Não me esqueço de muita coisa dita, analisada e discutida entre eles. Inúmeras passagens daquelas conversas ficaram entranhadas na minha mente de menino e de quando em quando assomam aos meus pensamentos pretensamente meditativos.
Numa daquelas ocasiões, ouvi meu pai confidenciar a um amigo:
– Só não viro comunista porque, nesse caso, tenho que me tornar ateu. E isso pode causar muito desgosto a mamãe.
Minha avó Neném, mãe do meu pai, era católica. Não digo que fervorosa, mas bastante devotada, assídua frequentadora das missas dominicais e de novenas domésticas. Ela era razoavelmente bem instruída: lia periódicos católicos, que meu pai assinava, mas também apreciava livros, jornais e revistas comuns. Porém, mais que instruída, minha avó paterna era uma pessoa consciente das questões sociais que aprofundavam diferenças entre as pessoas e martirizavam o povo sofrido daquele sertão nordestino onde vivíamos (questões estas ainda muito atuais; pois, se observadas por alguns ângulos, veremos que persistem de maneira talvez ainda mais grave que naquela época). Portanto, não creio que minha avó viesse a se mortificar se um dos seus filhos se comunizasse. Se isso acontecesse, e algumas de suas amigas beatas se escandalizassem, pressionando-a – “Neném! João agora é comunista ateu! Você precisa fazer alguma coisa!” –, ela certamente diria: “Foi a vontade de Deus. Vamos rezar”.
Imagine se minha avó vivesse hoje e tomasse conhecimento da afirmação de Frei Beto, num encontro com Fidel Castro, no início deste ano, quando o religioso disse ao comandante: “A Revolução Cubana é uma obra evangélica”. Aí minha avó diria: “Amém!”
A incorreta expressão “comunismo ateu”, como a propaganda capitalista ainda prega, enfática e endossada por religiosos fanáticos (eu disse “os fanáticos”), deve estar fundamentada na frase atribuída a Karl Marx: “A religião é o ópio do povo”. Frase e possíveis dissertações que ele, ou qualquer outro filósofo, tenha exposto sobre a questão; não sei, pois nunca li Marx, eu o conheço apenas de “ouvi falar”. Mas, assim sendo, Marx provavelmente se referia à manipulação dos princípios religiosos, pelo Estado e por entidades privadas, que os utilizavam como analgésico, a fim de suavizar a dor provocada pela escravidão a que estavam (e, levando em conta muitos aspectos das sociedades modernas, ainda estão) submetidos os trabalhadores. Se realmente Marx disse isso, e os comunistas sectários (eu disse “os sectários”) concordam, sem considerar a conjuntura da época em que ele teorizou o comunismo científico, é bom lembrar-se de que Marx não conheceu os atuais meios de comunicação de massa, os quais, de acordo com os interesses do deus mercado, neste mundo capitalista, transformam qualquer coisa em “ópio do povo”: futebol, telenovela e até a telefonia celular (o automóvel popular é o ópio do “semipovo”, a média classe média, que torce o nariz para o povaréu, definindo-o como "plebe ignara").
Nesses exemplos de religião, futebol, automóvel e mesmo telefone celular, transformados em “ópio do povo”, não significa que os objetos em si sejam, por si mesmos, perniciosos, mas indica tão-somente o mau uso que se faz deles, ou a manipulação social, moral, política e ideológica de fiéis, torcedores, consumidores e dos cidadãos em geral.
Laerte Braga, candidato a prefeito de Juiz de Fora, MG, pelo Partidão
O jornal Tribuna de Minas de domingo, 5/7, traz matéria de capa com reportagem/entrevista com Laerte Braga, candidato a prefeito de Juiz de Fora pelo PCB.
A matéria é aberta com o seguinte parágrafo:
“A cena é insólita. Quarta-feira, pouco antes do meio-dia, quatro comunistas dirigem-se para a entrada principal da Catedral de Juiz de Fora. A proposta um vídeo com o candidato do PCB à Prefeitura de Juiz de Fora, Laerte Braga, no adro da igreja, mas a chuva acabou levando o comunista e mais três camaradas a se esconderem sob o pórtico. Ali mesmo, em um só fôlego, foi feita a gravação. Dali, os quatro seguiram para outra aparente incongruência para quem é filiado ao partidão: almoço em um restaurante na área nobre da cidade. Mas, em ambos os casos, os convites foram feitos pela Tribuna, dentro da proposta de sabatina com todos concorrentes a prefeito.”
Para os repórteres, comunista na igreja é “cena insólita”, e “almoço em um restaurante na área nobre da cidade”, por pessoas filiadas ao Partidão, é "incongruência".
Laerte Braga, jornalista, comunista, umbandista e, para o nosso júbilo, colaborador desta nossa Agência Assaz Atroz, é um ser humano e, como tal, tem o direito de professar uma religião e externar suas escolhas, sentimentos e prazeres.
Pelo que me consta, alguns dirigentes do Partido Comunista da China frequentam templos budistas e até igrejas católicas. A Polônia, ainda sob o comunismo, ou “Socialismo Realista”, contava com mais de 80% de católicos em sua população. Eram comunistas carolas, não perdiam uma missa, procissão ou novena. Mesmo assim, setores da própria Igreja Católica ajudaram a desconstruir o sistema naquele país. Em Cuba, a liberdade religiosa é tal que o catolicismo, religião predominante na ilha, atua, sincrético, com diversas crenças afro-americanas.
Essa história de que comunista deve ser necessariamente ateu e precisa assumir votos de pobreza, ou ter apenas uma exclusiva relação com o que representa pobreza, é balela.
Aquilo que o capitalista ou qualquer ser humano gosta, ou seja, boa comida, excelente bebida, conforto e bem-estar, eu ("comunista instintivo"), Laerte Braga e a massa comunista cubana apreciamos até o caroço. Só não achamos que essas coisas devam ser concedidas, como privilégio, apenas a uma minoria “intelectualmente bem dotada”. E não quero nem considerar a polêmica frase de Joãozinho Trinta, que disse: “O povo gosta de luxo; quem gosta de miséria é intelectual”. Eu diria apenas que o carnavalesco poderia ter-se referido ao “pseudointelectual”, pois é esse tipo hipócrita que, com argumentos elitistas, defende a manutenção do establishment e come pelas beiras, nas redações de jornais e em altos cargos nas repartições públicas, ou conquistando cargos eletivos. Para essa gente, a meritocracia só deve funcionar em benefício dos letrados. Aos trabalhadores, as linhas de produção e as favelas.
Ser pobre em Cuba, por exemplo, não é uma opção pessoal nem uma imposição do sistema-regime, mas é, em considerável parte, uma consequência do bloqueio ainda imposto pelos capitalistas-imperialistas. Há os que rebatem esse argumento afirmando que a maioria dos países ocidentais restabeleceu relações diplomáticas com Cuba e mantém com aquele país intercâmbios cultural e comercial. Entretanto, a maior potência econômica e militar do Planeta, os EUA, sustenta, até os dias atuais, o embargo a Cuba. Em consequência disso, uma indústria francesa de chocolate, por exemplo, não pode exportar seus produtos para os EUA porque usa açúcar cubano em sua produção. Outros apontam o fato de existir em Cuba luxuosos hotéis e restaurantes que só podem ser frequentados por turistas. Aí eu pergunto: “E desde quando os hotéis e restaurantes estrelados daqui podem ser frequentados pela plebe?”
Já dizia Che Guevara: “Não nego a necessidade objetiva do estímulo material, mas sou contrário a utilizá-lo como alavanca impulsora fundamental. Porque então ela termina por impor sua própria força às relações entre os homens”. Pois é, e assim acabam transformando pieguices noveleiras e até bugigangas em “ópio do povo”.
Tem gente que concentra patrimônio tal que nem mesmo vivendo 300 anos teria como usufruir de tudo o que possui: terras, empresas, mansões, carrões, iates, jatinhos, haréns e milhões de dólares em paraísos fiscais. Tudo em detrimento daqueles que realmente geram a riqueza de uma nação. E é essa gente que faz eleger a maioria dos candidatos a cargos eletivos, que só alcançam seus objetivos sob a força de muita grana. Suas plataformas eleitorais não passam de instrumento de suas perversas demagogias.
Lembrando-me ainda de minha avó.
Eu tinha lá uns oito anos de idade, me aproximei de minha avó Neném, que, devido à vista curta, estava com uma revista quase grudada nos olhos. Interrompi a sua leitura perguntando:
– Vovó, pra ganhar no jogo do bicho a gente deve pedir a Deus ou ao diabo?
Ela respondeu pausadamente, a fim de que eu não esquecesse seu conselho:
– Tudo que você desejar, mesmo aquilo que você considerar errado ou mau, peça a Deus. Nunca ao diabo. Ele vai lhe conceder ou não. Se Ele conceder, é porque aquilo será para o seu bem.
Por isso, peço a Deus que o povo juiz-forano saiba aproveitar essa oportunidade e eleja Laerte Braga prefeito de Juiz de Fora.
Amém!
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Leia a entrevista da Tribuna de Minas com Laerte Braga.
Acesse a matéria clicando no título...
E veja a declaração de Fernanda Tardin, esposa de Laerte, no blog Juntos Somos Fortes:
“PARABÉNS AOS JORNALISTAS e ao JORNAL que fazem esta cobertura democrática. Quando antes tivemos espaço, na mídia tradicional, que fosse fiel a nossa luta? Hoje temos um exemplo. Parabéns ao jornal e a equipe. Hasta siempre, afinal TODOS somos beneficiados quando a DEMOCRACIA sobrevive. Onde as idéias são colocadas de forma LEAL. Hoje estes jornalistas honram a profissão: Oferecem espaço para que o POVO acorde e sinta que SEM PARTICIPAÇÃO POPULAR não existe mudanças benéfica ao POVO.”
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