sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Teólogo/a - persona non grata? - Bismarck Frota de Xerez

Carlo Tursi *
Adital -
Conferência de Ivone Gebara na Semana Dom Helder Camara (final de setembro)
A "maré" eclesial, definitivamente, não está para teólog@s; está mais para animadores de platéias, curandeiros, exorcistas, padres cantores e oradores em línguas. "Neste momento [...] estamos, teologicamente, como que parados, passando por uma espécie de desânimo. [...] Os nossos teólogos demonstram um pouco de medo" - palavras de Dom Aloísio Lorscheider (em: "Mantenham as lâmpadas acesas!", Ed.UFC 2008, p.90). Ao recuo da razão teológica corresponde, no atual cenário eclesial, o avanço pujante de uma espiritualidade sentimentalista, devocional e intimista que se afasta de tudo que cheira a "crítica" como o "cão" se afasta da cruz. De fato, o esforço teológico por uma compreensão mais profunda e madura dos dados da fé revelada há de se desdobrar - inevitavelmente e desde os tempos remotos dos "santos padres" - em exercício da "crítica", no sentido positivo de apontar contradições no pensar e incoerências no agir dos cristãos e tentar eliminá-las. Durante os últimos 100 anos de história da Igreja, a atitude do Magistério Eclesiástico para com a crítica teológica tem oscilado bastante: de um certo incentivo a novas investigações bíblico-teológicas sob o papa Leão XIII às duras condenações sob Pio X, de uma nova abertura durante o pontificado de Pio XI à onda de cassações com Pio XII, da reabilitação de muitos teólogos cassados por João XXIII e Paulo VI aos "silêncios obsequiosos" impostos na era de João Paulo II e do então cardeal Ratzinger. O atual "inverno da teologia" é, indubitavelmente, fruto das duras intervenções que a Cúria Romana tem perpetrado, ao longo das últimas duas décadas, em muitos institutos de formação teológica da América Latina, chegando a ordenar o fechamento de alguns deles, como foi o caso do ITER (1989), no Recife, a "menina dos olhos" de Dom Helder Camara. Quem o afirma - e lamenta - é, mais uma vez, o cardeal Lorscheider: "A própria teologia aqui na América Latina, ao invés de ser favorecida, foi um tanto calada. Por isso, hoje em dia, ninguém mais tem coragem de falar". E arremata: "Esse medo faz mal. O Magistério não devia incutir esse medo!" (2008, p.91).
O porquê desta hostilização da teologia? É que a leitura histórico-crítica da Sagrada Escritura e da História Eclesiástica teria trazido mais danos do que benefícios ao "povo de Deus", semeando questionamentos e dúvidas em meio aos fiéis, provocando até crise de fé em não poucos. Reclamava, em 1990, o cardeal Ratzinger na "Instrução sobre a Vocação Eclesial do Teólogo": "O teólogo, não esquecendo jamais que também ele é membro do povo de Deus, deve nutrir-lhe respeito, e esforçar-se por dispensar-lhe um ensinamento que não venha a lesar, de modo algum, a doutrina da fé" (nº11). A crítica teológica não teria sabido contentar-se com os campos da interpretação bíblica e histórica - teria "avançado o sinal" e começado a questionar as próprias definições, consagradas há séculos, da Teologia Dogmática, bem como a estrutura hierárquica da própria Igreja. Desconcertados e, talvez, até decepcionados com o intelectualismo e criticismo dos teólogos, muitos católicos a eles teriam dado as costas e se lançado em grupos de oração, seminários do Espírito Santo e procissões devocionais onde - supostamente - alimentariam melhor a sua espiritualidade, pensando menos e sentindo mais. Que o abandono da razão teológica, contudo, não pode ser uma saída aceitável provou, justamente, uma encíclica do papa João Paulo II, intitulada "Fides et ratio", que insiste em uma necessária articulação e interdependência entre fé e razão...
A teóloga feminista Ivone Gebara, religiosa da Congregação das Cônegas de Santo Agostinho e doutora em Filosofia e Ciências da Religião, lecionou durante 17 anos no Instituto Teológico do Recife (ITER), até o seu fechamento por ordem de Roma. Experimentou dolorosamente, alguns anos depois, uma condenação ao silêncio obsequioso, tendo que se afastar, por um período de dois anos, da docência e da publicação de qualquer escrito seu. Após cumprir a penalidade imposta pelo Vaticano, veio a público com a obra "Rompendo o Silêncio" (Petrópolis 2000). É com muita propriedade, portanto, que ela proferirá conferência durante a SEMANA DOM HELDER CAMARA, na noite do dia 30 de setembro, às 19:00 h, no auditório do Colégio Santo Tomás de Aquino, com o tema "A repressão ao pensamento teológico na Igreja, hoje". Quem viver, verá. Aquela noite promete...

Carlo Tursi, teólogo e membro de "O GRUPO"
* Teólogo católico e membro da recém-eleita coordenação arquidiocesana de CEBs, em Fortaleza, Ceará

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