sábado, 9 de maio de 2009

NOTA PÚBLICA - Nota sobre as declarações do presidente do STF, Gilmar Mendes (CPT Assessoria de Comunicação) - Vanderley Caixe

Nota Pública sobre as declarações do presidente do STF, Gilmar Mendes.

A Coordenação Nacional da CPT diante das manifestações do presidente
do STF, Gilmar Mendes, vem a público se manifestar.



No dia 25 de fevereiro, à raiz da morte de quatro seguranças armados
de fazendas no Pernambuco e de ocupações de terras no Pontal do
Paranapanema, o ministro acusou os movimentos de praticarem ações
ilegais e criticou o poder executivo de cometer ato ilícito por
repassar recursos públicos para quem, segundo ele, pratica ações
ilegais. Cobrou do Ministério Público investigação sobre tais
repasses. No dia 4 de março, voltou à carga discordando do
procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, para quem o
repasse de dinheiro público a entidades que "invadem" propriedades
públicas ou privadas, como o MST, não deve ser classificado
automaticamente como crime.O ministro, então, anunciou a decisão do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do qual ele mesmo é presidente, de
recomendar aos tribunais de todo o país que seja dada prioridade a
ações sobre conflitos fundiários.

Esta medida de dar prioridade aos conflitos agrários era mais do que
necessária. Quem sabe com ela aconteça o julgamento das apelações dos
responsáveis pelo massacre de Eldorado de Carajás, (PA), sucedido em
1996; tenha um desfecho o processo do massacre de Corumbiara, (RO),
(1995); seja por fim julgada a chacina dos fiscais do Ministério do
Trabalho, em Unaí, MG (2004); seja também julgado o massacre de sem
terras, em Felisburgo (MG) 2004; o mesmo acontecendo com o arrastado
julgamento do assassinato de Irmã Dorothy Stang, em Anapu (PA) no ano
de2005, e cuja federalização foi negada pelo STJ, em 2005.

Quem sabe com esta medida possam ser analisados os mais de mil e
quinhentos casos de assassinato de trabalhadores do campo. A CPT, com
efeito, registrou de 1985 a 2007, 1.117 ocorrências de conflitos com a
morte de 1.493 trabalhadores. (Em 2008, ainda dados parciais, são 23
os assassinatos). Destas 1.117 ocorrências, só 85 foram julgadas até
hoje, tendo sido condenados 71 executores dos crimes e absolvidos 49 e
condenados somente 19 mandantes, dos quais nenhum se encontra preso.
Ou aguardam julgamento das apelações em liberdade, ou fugiram da
prisão, muitas vezes pela porta da frente, ou morreram.

Causa estranheza, porém, o fato desta medida estar sendo
tomada neste momento. A prioridade pedida pelo CNJ será para o
conjunto dos conflitos fundiários ou para levantar as ações dos sem
terra a fim de incriminá-los? Pelo que se pode deduzir da fala do
presidente do STF, "faltam só dois anos para o fim do governo Lula"...
e não se pode esperar, "pois estamos falando de mortes" nos parece ser
a segunda alternativa, pois conflitos fundiários, seguidos de mortes,
são constantes. Alguém já viu, por acaso, este presidente do Supremo
se levantar contra a violência que se abate sobre os trabalhadores do
campo, ou denunciar a grilagem de terras públicas, ou cobrar medidas
contra os fazendeiros que exploram mão-de-obra escrava?



Ao contrário, o ministro vem se mostrando insistentemente zeloso em
cobrar do governo as migalhas repassadas aos movimentos que hoje
abastecem dezenas de cidades brasileiras com os produtos dos seus
assentamentos, que conseguiram, com sua produção, elevar a renda de
diversos municípios, além de suprirem o poder público em ações de
educação, de assistência técnica, e em ações comunitárias. O ministro
não faz a mesma cobrança em relação ao repasse de vultosos recursos ao
agronegócio e às suas entidades de classe.



Pelas intervenções do ministro se deduz que ele vê na organização dos
trabalhadores sem terra, sobretudo no MST, uma ameaça constante aos
direitos constitucionais.



O ministro Gilmar Mendes não esconde sua parcialidade e de que lado
está. Como grande proprietário de terra no Mato Grosso ele é um
representante das elites brasileiras, ciosas dos seus privilégios.
Para ele e para elas os que valem, são os que impulsionam o
"progresso", embora ao preço do desvio de recursos, da grilagem de
terras, da destruição do meio-ambiente, e da exploração da mão de obra
em condições análogas às de trabalho escravo. Gilmar Mendes escancara
aos olhos da Nação a realidade do poder judiciário que, com raras
exceções, vem colocando o direito à propriedade da terra como um
direito absoluto e relativiza a sua função social. O poder judiciário,
na maioria das vezes leniente com a classe dominante é agílimo para
atender suas demandas contra os pequenos e extremamente lento ou
omisso em face das justas reivindicações destes. Exemplo disso foi a
veloz libertação do banqueiro Daniel Dantas, também grande
latifundiário no Pará, mesmo pesando sobre ele acusações muito sérias,
inclusive de tentativa de corrupção.



O Evangelho é incisivo ao denunciar a hipocrisia reinante nas altas
esferas do poder: "Ai de vocês, guias cegos, vocês coam um mosquito,
mas engolem um camelo" (MT 23,23-24).



Que o Deus de Justiça ilumine nosso País e o livre de
juízes como Gilmar Mendes!



Goiânia, 6 de março de 2009.





Dom Xavier Gilles de Maupeou d'Ableiges

Presidente da Comissão Pastoral da Terra





Maiores informações:

Assessoria de Comunicação - Secretaria Nacional da CPT
Fone: 62 4008-6406/ 6412 / 6400
www.cptnacional.org.br

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